sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

De como aprendi a respeitar...

Os sábados eram para mim como um dia de sol. Esperava ansioso por ele, desejava cada segundo daquele dia. Íamos todos ao supermercado, religiosamente. Embora, não fosse assim com os cumprimentos cristãos que envolviam minha família.
Minha mãe encarregava-se de cuidar dos três filhos – eu, Joana e Vinícius- enquanto meu pai ficava com a tarefa mais árdua e entediante de todas, ele reclamava e como se não bastasse reclama muito e repetidas vezes, tantas quantas se fizessem necessárias para nos convencer de que quanto mais crescíamos, mais seríamos capazes de consumir o seu salário.
E como era alto o preço do pão diante dos olhos atentos de meu pai, ele era capaz de reproduzir todo o trajeto do feijão, da plantação até minha mesa, só para deduzir os gastos e o preço daquele comércio. Ele era definitivamente o melhor matemático de todos.
Minha mãe ouvia seus conselhos pacientemente, e eles esbarravam até na maneira como ela deveria preparar os alimentos. Ela realmente era uma santa! Meu próprio pai costumava dizer:
- Santinha, traga meu jantar!
E nessas horas ela sorria com um ar de gratidão pelo carinho concedido. Ah! Como era santa minha mãe, e eu só aprendi a vê-la depois de adulto.
Numa dessas idas e vindas ao mercado, como era nosso costume, planejávamos quais brincadeiras teriam a vez naqueles imensos corredores. Mas daquela vez foi diferente! Planejamos e efetuamos tudo que nos fora permitido até ouvirmos a voz de nossa mãe que clamava por ordem e silêncio. Como insisti em continuar com minha voz estridente aos berros de: “- Pega ele! –Pega ele!” levei um imenso puxão de orelha. Minha mãe sabia que aquela dor beirava o insuportável e por isso o fazia repetidas vezes, até que nos calássemos.
Mas nenhuma dor do mundo superou até hoje aquela cena que ela, com seu dedo indicador, mudou minha vida. Seguida de uma fala ameaçadora, dizia minha mãe:
- Vocês estão vendo aquele menino? Aquele na cadeira de rodas sendo empurrado por sua mãe? Aquilo foi um castigo por ele não ter obedecido!
Eu não entendia por qual razão ele era diferente, mas seus movimentos lentos e seu balbuciar não eram iguais aos meus. Ele me olhava e tentava um leve sorriso , mas não saía nada.
Passei imensas horas de anos da minha vida imaginando por qual motivo aquela mãe havia dado tão doloroso castigo ao seu filho. Que mal poderia ter feito ele? Será que havia roubado um doce antes do jantar ou sujado sua roupa antes de cantar os parabéns? Brigado com os irmãos não poderia ser, pois não era tão grave assim!
Resolvi respeitar mais a minha mãe, não saberia dizer por quanto tempo ela seria capaz de me conduzir numa cadeira de rodas.
Lucilene Bonafé

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

O menino das meias vermelhas

Todos os dias, ele ia para o colégio com meias vermelhas.
Era um garoto triste, procurava estudar muito mas na hora do recreio, ficava afastado dos colegas, como se estivesse procurando alguma coisa. Os outros garotos zombavam dele, implicavam com as meias vermelhas que ele usava.
Um dia, perguntaram porque o menino das meias vermelhas só usava meias vermelhas.
Ele contou com simplicidade: "no ano passado, no meu aniversário, a minha mãe levou-me ao circo. Calçou- me estas meias vermelhas. Eu reclamei, comecei a chorar, disse que toda a gente ia rir de mim por causa das meias vermelhas. Mas ela disse que se me perdesse, bastaria olhar para o chão e quando visse um menino de meias vermelhas saberia que o filho era dela".
Os garotos responderam: "Mas tu não estás num circo! Porque não tiras essas meias vermelhas e jogas fora?"
Mas o menino das meias vermelhas explicou: - "é que a minha mãe abandonou a nossa casa e foi embora. Por isso eu continuo usando estas meias vermelhas. Quando ela passar por mim vai me encontrar e me levará com ela." - Carlos Heitor Cony

O príncipe que aprendeu amar

Era uma vez um reinado, desses iguais a tantos outros, com um príncipe, um cavalo branco e muitos, mas muitos empregados. O jardim encantava com suas cores, e o sorriso era ordem intacta em dias de sol e chuva. Também seria igual a tantos outros, se não fosse pela postura de seu regente.
Aquele era um ser inigualável – um príncipe órfão que recebera de seus pais a árdua tarefa de mandar. E mandar era o que fazia de melhor. Era a única qualidade da qual se vangloriava em suas belíssimas canções.
Criatura pequena em estatura, mas Hercúleo em ações. Deliberava e pronto! Lá estavam todos aos seus pés, cumprindo suas obrigações. E entre mandos e desmandos, naquele dia, o reinado foi abalado por um deslumbre.
- Ordeno que todos os homens e mulheres do meu reinado deixem de amar!
- E como faremos isso? – perguntou um pobre qualquer.
E do alto de sua torre, respondeu ele:
- Deixem de amar! Os olhos não deverão mais brilhar, esqueçam as músicas, dominem as batidas de seus corações!
Pronto! A desordem se instalou pelos quatro cantos daquela região. Não havia silêncio, não havia tolerância, não havia sentimento que bastasse .
Durante anos, as flores perderam seu perfume e os pássaros já não encantavam com suas melodias. Entre as borboletas ouviam-se murmúrios de que já não deveriam passear por ali, pois poderiam se contaminar com tamanha crueldade. As árvores desistiram até de crescer e dar frutos, já não recebiam a atenção dos casais enamorados que aos seus pés trocavam suas declarações de amor e juras eternas.
Fechado em sua ganância e alheio a qualquer tipo de pedido, seguia o nosso príncipe.
- Fechem as portas!
- Tragam a minha refeição!
- Chamem o bobo da côrte!
Pobres servos, mal entendiam a razão de tantas ordens. Só podiam mesmo ouvir e cumprir. Entendiam aos poucos quem é que mandava por ali.
E assim foi, que dia após dia, a amizade entre eles se deteriorava, e aquilo que era amor transformou-se em revolta e indignação. Resolveram, então, contrariar as ordens de seu príncipe,confabularam uma grande festa em celebração à alegria, passaram dias costurando, lavando, arrumando, enfeitando aquele reinado e no dia combinado, podia-se ver novamente o aroma doce e encantador daquele povo.
O príncipe que nem mesmo havia sido convidado sentiu-se traído e resolveu se fechar em seu castelo. Gritou, brigou, esperneou, mas nada conseguiu mudar. Sua voz já não ecoava, suas leis não eram mais respeitadas.
No desejo de controlar aquela situação o pequeno foi ao encontro do sábio Loui – aquele sim, conhecia todas as coisas. E ao contar sua terrível jornada foi por alguns minutos observado por ele que apenas cortejou-lhe com uma única frase:
- O sentimento que se dá, deve ser imensamente superior ao que se pretende!
O caminho de volta nunca fora tão longo e a cada cavalgada seu pensamento parecia lhe consumir. Sentia o vento em seu rosto e todo encanto dos raios de sol, pudera sentir também um cheiro há muito esquecido, parecido com o odor dos biscoitos quentinhos preparados no final de uma tarde chuvosa. Lembrou-se do afago de sua mãe e do sorriso largo de seu pai que insistia em fazê-lo andar. Pôde vibrar com as batidas de seu coração, e finalmente percebera o encantamento da felicidade.
Descobriu, enfim, que mandar não é sinônimo de amar, e que quando se ama não há hierarquia, apenas se ama. E que talvez esta seja a chave de todo entendimento.

Lucilene Bonafé

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

A caixinha de segredos

Lá estava ela, a garota dos olhos de mel, entre seus amiguinhos de sala. Contavam-se dois ou três, pois o restante distanciava-se devido ao seu importúnio sentimento de timidez.
Os bancos largos e incômodos eram cúmplices de grandes ideias, de grandes sonhos. Desejava algo inusitado, assim como, inusitado era seu zelo por aquilo que curiosamente carregava - uma caixinha dourada, dessas que não se vê muito por aí, mas que para ela tinha tamanho valor quanto sua fiel vontade de fazê-la viver.
Os pensamentos voavam ao som melódico de vozes que insistiam em lhe trazer de volta. Vivia entre nuvens e estrelas, e fazia desse, o seu ambiente particular. Às vezes, apertava tanto sua pequena caixinha, como se dando-lhe amor, pudesse fazê-la cumprir. E era assim que amava.
Um belíssimo dia,desses que encontramos em romances, deixou solitária sua companheira, correu para buscar novas fitas, novas rendas, novos enfeites que pudessem abrilhantar sua caixinha. Precisava renová-la, pois também tinham sido renovadas as esperanças. Encantou-se tanto com as cores, com as formas, com as flores que lhe apresentaram, que se deixou embriagar pela novidade. E por alguns momentos deu-se a esquecer de sua amiga solitária.
Ao reencontrá-la, percebera que algo havia mudado, algo havia se perdido entre as duas. Abraça-la não fora suficiente para trazê-la à vida.
Ninguém jamais tinha ousado tanto, ninguém jamais tinha chegado tão perto de pertencê-la. Mas, aquele foi um dia especial - não exatamente no contentamento.
Roubaram-lhe os sonhos, o tesouro precioso havia se esvaziado, não sobrou nada além de uma caixa - simples e dourada.
Para a pobre menina, que teimava em observá-la em seu contorno, em sua profundidade, em sua forma e velha cor; restou também um vazio, que saltava-lhe além do ser e uma ingênua esperança de que pudesse preenchê-la novamente. Pobre menina, pobre também era sua caixa.
Trazia nela todos os sonhos do mundo. Perderam-se todos, em absoluto silêncio.

Lucilene Bonafé

Orações Coordenadas

ORAÇÕES COORDENADAS _________________________________________ Exercícios Classifique as Orações Coordenadas Sindéticas: O1 - Nã...